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terça-feira, 23 de agosto de 2011

30 anos



Abrindo um antigo caderno
foi que eu descobri:
Antigamente eu era eterno.




          É engraçado o que uma data que representa. Trata-se nada mais que uma mera convenção cronológica. Os números mudam e automaticamente (ou não?) mudam os comandos em nossa cabeça e, no meu caso, o peso de 30 anos veio com a maior leveza possível. A infância é doce e a adolescência é livre, diz-se ... para mim, isso é muito relativo. Acho que fui criado adulto demais para ser criança e a adolescência é chata e complicada demais para quem habita um universo paralelo ... o idealismo de conquistar o mundo aos 18, a sensação de ser eterno e suposta liberdade dos 20 e poucos anos foi substituída agora pela segurança (?!) dos 30 recém completos ... quem tiver 40, 50 ou 60 que ria à vontade, mas 30 anos é uma idade única! Posso felizmente traçar um panorama sobre passado e futuro, sem sonhar ainda ser astronauta (no meu caso, arqueólogo) e sem imaginar que a vida toda já sei foi sem retorno, com a sensação de que há ainda atalhos a se tomar sem que se chegue à curva final do penhasco ...

Imagem: “A condição humana”, René Magritte (1935)

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Onzes de setembro





Logo teremos mais um 11 de setembro... todos no mundo se lembram hoje o que essa data significa. É uma data triste e que remete ao dia que o país mais poderoso do mundo foi atacado. Mais do que isso, remete ao dia em que milhares de pessoas em território norte-americano foram mortas em nome de... de que? Ser morto em prol de uma causa, mesmo que não se esteja diretamente envolvido nela, tem maior valia do que a morte dita natural? Terroristas islâmicos lideraram o ataque ao grande inimigo no Oeste... não há como não pensar em algo que o fanatismo ofusca: As pessoas que ainda choram seus mortos em Nova York eram realmente culpadas por morarem no grande representante da civilização ocidental? Aos olhos fanáticos sim, aos meus olhos, são vítimas cujos entes queridos recordarão eternamente esse fatídico dia...
Nesse mesmo dia, em 1944, um país ocidental, maior aliado dos EUA, bombardeou a Alemanha. A Força Aérea Britânica bombardeou a cidade de Darmstadt, já quase no fim da investida dos Aliados na Europa contra as forças nazistas... vencer Hitler era preciso, mas ainda assim penso: Todos os 12.000 mortos nesse 11 de setembro eram culpados pela destrutiva política nazista de seu país? Muitas pessoas inocentes choraram seus mortos nesse mesmo dia no interior da Alemanha... muitos ainda choram.
A mesma Alemanha nazista que tantas mortes causou em suas invasões e em seus campos de extermínio, nesse mesmo dia 11 de setembro, evacuou o gueto judaico de Minsk, na Bielo-Rússia, como fez em tantas outras cidades da Europa, mandando para a morte pessoas que pagavam o preço de terem nascido judeus, ciganos ou se tornado comunistas... essas terríveis mortes ainda marcam o mundo. Milhões ainda choram seus mortos... o Holocausto está presente mesmo décadas depois em nossas memórias.
Há não muito tempo, em 11 de setembro de 1982, forças internacionais que auxiliavam na segurança de refugiados palestinos no Líbano deixaram o país em plena invasão israelense... o que se seguiu nos próximos dias foi o que se conhece hoje por Massacre de Sabra e Chatila, em que as forças de Israel massacraram 3500 pessoas no sul do Líbano. Em nome de que? Disputas territoriais? Diferenças religiosas? Defesa? O grande fato é que ainda hoje palestinos e libaneses recordam seus mortos e os israelenses, que tiveram finalmente sua nação logo após a 2º Guerra Mundial, ainda não conseguiram entrar em acordo algum com seus vizinhos. Então, me questiono: Será que estão em conflito porque ainda choram seus mortos nos campos de concentração, da mesma forma que alemães choram seus mortos em bombardeios aliados e norte-americanos choram seus mortos no ataque terrorista? Como já disse antes, as pessoas, infelizmente procuram chorar somente por mortos que consideram seus... e gritam sua dor ao mundo em uma atitude de auto-piedade. Apenas a sua própria, única e insuportável dor conta a seus olhos...
Os mesmos norte-americanos que choram o “seu 11 de setembro”, nessa mesma data em 1973 impuseram um golpe militar no Chile, que levou a milhares de mortos e instaurou uma ditadura tal qual em outros países como Argentina, Brasil e Uruguai, gerando assassinatos, desaparecimentos e tortura. Até hoje os chilenos se dividem por esse golpe que tirou do poder um líder acusado de comunista pelos norte-americanos por implantar políticas de auxílio ao povo... será essa data lembrada pelos norte-americanos também? Ou ela pertence unicamente aos chilenos?
A data em si, 11 de setembro, não passa de uma mera convenção cronológica... o fato é que, por causa da religião, da política, do preconceito, do dinheiro, da cegueira, da intolerância, milhões choram seus mortos pelo mundo ... e nenhuma chama em nenhum lugar além de suas casas será acesa para lembrar quem se foi injustamente (há morte justa?) No Chile ou no Líbano, na Alemanha ou em Israel, nos EUA ou na Bielo-Rússia, pessoas chorarão seu 11 de setembro e, pelo mundo afora, a cada nova manhã, milhões continuarão se lembrando de um dia perdido no passado, marcado somente em seu calendário, que mudou completamente suas vidas e que ninguém mais, além de si mesmos, irá recordar.

Foto: Palácio de La Moneda, Santiago (Chile), em 11/09/1973.