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segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Sílvio Fiorani: Meu tipo inesquecível


Há alguns escritores com o qual nos identificamos desde o início. No caso de Sílvio Fiorani, me chamou a atenção já em uma primeira leitura a sua maneira simples, mas tocante de construir sua ficção. Mais do que isso, apesar de aprendermos a separar o caráter biográfico e referencial dos autores na sua prosa, é inegável a influência que ele carrega, fato que se expressa vivamente em suas obras. Sílvio Fiorani assim como eu, é um oriundi, de família ítalo-brasileira e nasceu aqui no norte do estado de São Paulo, bem próximo de minha cidade, o que o faz caipira como eu também. Não pude deixar de me ver em suas obras, em especial no romance, e me sinto honrado em publicar hoje em meu blog um conto escrito por esse brilhante artista, vencedor do Prêmio Machado de Assis, da Biblioteca Nacional, em 2006, pelo romance “Investigação sobre Ariel”
Apresento a quem ainda não conhece, o Sr. Sílvio Fiorani:

Meu tipo inesquecível

"Faz tempo que eu quero escrever para a senhora, mas o pessoal aqui de casa não deixa, todos acham que é uma tolice, uma loucura, uma loucura, dizem isso mesmo. Escrever para uma pessoa da televisão, ridículo. Seriam capazes de não me deixar ir ao correio pôr esta carta, seriam capazes não, não me deixariam mesmo, esta a verdade, pois dizem isso claramente e eu tenho que ficar calada, me conformar, prometer que não vou botar carta nenhuma no correio, com medo que eles me tirem a televisão, assim fico sem ver o seu programa que é a maior alegria que eu tenho nesta vida, sendo o seu o único programa que eu vejo sozinha, sem ninguém pra atrapalhar, pois de tarde está todo mundo trabalhando e eu apresso minhas tarefas, sou uma velha que não serve senão para limpar a casa, para eles sujarem de noite, para eu limpar no dia seguinte, e assim para todo o sempre, eternamente até que eu morra, ai vão sentir minha falta, aí sim é que eu vou querer ver, mas como estava dizendo, eu apresso minhas tarefas para ter a tarde livre, para sossegadamente ver o seu programa que a senhora não sabe tem sido de muita valia para mim, meu refrigério, uma grande consolação, é como se a senhora fosse minha amiga de verdade, minha amiga a senhora sempre diz, os seus conselhos são os conselhos que eu sempre quis ouvir, como a senhora sabe compreender as mulheres e os velhos, os idosos como a senhora sempre diz, como a senhora sabe compreender as crianças, e as moças solteiras desnorteadas, e as mal casadas, e as outras, e as domésticas, os paralíticos, os bêbados, bem, estou dizendo tudo isso que é claro como o dia e estou deixando de lado o principal, a verdadeira razão desta carta que eu tanto quis escrever e pôr no correio sem que eles soubessem, porque a grande razão destas linhas, o principal de tudo mesmo é que eu vejo a senhora todos os dias, sem faltar um programa, não tiro os olhos da televisão por nada deste mundo, me caia a casa em cima, caia o mundo, digo mais uma vez, não tiro os olhos da senhora um instante, vejo a senhora todo santo dia, e agora queria muito, mas muito mesmo saber, isto é muito importante para mim, pode dizer a verdade, seja franca como só a senhora sabe ser, eu vejo a senhora todos os dias, e a senhora?, pode dizer francamente, a senhora me vê?"

O presente texto faz parte de “Os Estandartes de Átila”, de 1980

2 comentários:

conceição disse...

Ah, Carlos Eduardo, gostaria de parabenizar pelo conto do Sílvio que você postou. Será que você poderia me enviar alguma informação que você posssua sobre o autor. E o livro onde você encontrou porque ele foi editado em 80 e não encontrei em nenhuma livraria virtual. Eu preciso destas informações porque estou realizando uma monografi sobre um conto do livro Os estandartes de Átila, daí meu interesse, ok? Agradeço sua atenção. Conceição

conceição disse...

Esqueci de colocar o e-mail caso você possa me respostar:conceioo@yahoo.com.br
Obrigada